sexta-feira, novembro 29, 2013

Trem Noturno para Lisboa

Mesmo sabendo que uma carreira premiada não garante infalibilidade a qualquer diretor, ainda assim é difícil entender como o dinamarquês Bille August realizou um filme tão superficial como este Trem Noturno para Lisboa. Com duas Palmas de Ouro no currículo e diversos outros prêmios em festivais, August erra a mão ao adaptar para o cinema o homônimo livro, sucesso editorial europeu que já vendeu mais de 2,5 milhões de exemplares.

A história é sobre Raimund Gregorius (Jeremy Irons) um professor de filosofia suíço que um dia evita o suicídio de uma jovem, impedindo-a de saltar da ponte. Sem explicação, ela desaparece, mas deixa um casaco com um livro no bolso. Um livro português.

Fascinado pelo livro, pela história de seus personagens, e intrigado pela jovem cuja vida salvou, Gregorius abandona sua vida rotineira e viaja até Lisboa atrás de pistas sobre a misteriosa mulher e sobre o autor do livro.

Em terras portuguesas, vai se deparar com pessoas consumidas por paixões desenfreadas, marcadas pela violência da ditadura de Salazar e pelas sequelas de um tempo em que se rebelar era a única forma de se sentir vivo. Pois é justamente esta vivacidade que Gregorius busca, já que não demora a perceber que o livro o fez despertar da letargia solitária que se tornou sua vida.

Mas a riqueza poética, histórica e sentimental que poderia surgir dessa trama, logo na primeira cena começa a se diluir pelo destempero e pela superficialidade novelesca que acompanhará todo o filme. Ao mostrar seu protagonista jogando xadrez consigo mesmo, o diretor inicia seu filme com uma descarada muleta, constrangedoramente óbvia, para simbolizar a solidão de seu personagem.

Já desde esse início clichê, a trilha sonora se intromete. Suas notas, repetidas à exaustão durante o restante do filme, soam sempre elementares na melancolia que querem emoldurar. Daí em diante, o que se arrasta na tela é uma série de encontros, desencontros e ações que muito raramente flertam com alguma lógica ou coerência interna. Nem trama nem personagens parecem se encaixar e a desarmonia disso resulta em artificialismo ou emoções vazias.

À medida que Gragorius avança em sua investigação sobre o autor do livro, vai se tornando o fio condutor de uma trama paralela, desenvolvida na tela por flashbacks a partir de relatos das pessoas com quem ele vai se encontrando.

Mesmo desconsiderando as grandes coincidências que o roteiro não se furta a lançar mão, o avançar quase sem obstáculos do protagonista rumo à finalização de seu nem tão desafiador quebra-cabeças, apenas reforça a esterilidade que transita pela tela. Uma esterilidade que destoa dos grandes atores que o filme apresenta.

Charlotte Rampling, Bruno Ganz, August Diehl e Christopher Lee (além do próprio Irons), são alguns dos nomes de relevo que ajudarão a contar a história. Nenhum deles, contudo, alcança alguma dimensão além do superficial. Em alguns casos, são menos que a personificação de caricaturas, o que faz das relações costuradas entre eles um acumulado insosso de frágil dramaturgia.

Trem Noturno para Lisboa é antes de tudo um filme pretensioso. Mas encontra nas suas limitações simplistas o desmoronamento dessa pretensão. Quer ser poético, inspirador e apaixonante, tudo ao mesmo tempo, e na ânsia de sê-lo revela-se um inflado de grande vazio.

Como se seguisse algum manual esquemático, parece crer que a simples combinação de música insistente, personagens solitários, segredos e traumas do passado, uma juventude política contra um regime autoritário e o fogo das paixões de um triângulo amoroso juvenil bastariam, empilhados, para funcionar. Mas não, não bastam. O resultado é decepcionante.
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Night Train to Lisbon
Bille August
Alemanha/Suíça/Portugal, 2013
111 min.


Trailer

1 comentários:

Camille disse...

Larguei esse no meio... Pensei que só eu tinha achado chato.
Cam

 

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