quarta-feira, janeiro 30, 2013

O Lado Bom da Vida

Comédia romântica ou comédia dramática? O Lado Bom da Vida, adaptação do livro homônimo de Matthew Quick, tem essa indefinição. Não que seja necessário ou mesmo importante enquadrar um filme em algum rótulo. Essa peculiar indefinição é apenas um modo de ilustrar a característica singular desse filme, que pende para ambos os lados em um equilíbrio prazeroso de ver.

Bradley Cooper interpreta Pat, um sujeito que acaba de receber alta de uma clínica para tratamento psiquiátrico. Ele foi internado depois de agredir o amante de sua mulher num acesso de fúria. Diagnosticado com transtorno bipolar, regressa para a casa dos pais alimentando a obsessão de se reconciliar com a ex-mulher, da qual deve manter distância devido a uma ordem judicial.

Convidado para jantar com um casal de amigos, conhece Tiffany (Jennifer Lawrence), uma jovem viúva cujo marido era policial. Ela também se recupera do trauma, que a tem levado a um comportamento sexual considerado impróprio. De imediato, surge entre eles uma conexão através das experiências traumáticas que tiveram. Mas a afinação desse vínculo custará a se firmar. Isso porque existe uma certa distopia no que cada um busca.

Pat quer a todo custo provar para a ex-mulher que está melhor e que pode retomar o casamento. Já Tiffany procura um amigo que a entenda mais intimamente do que as outras pessoas. A beleza dessa relação vem justamente dessa afinidade distorcida em compartilham o mesmo sentimento de serem vistos com desconfiança e reprovação pela sociedade e pela família.

No caso de Pat, o aspecto familiar tem um peso maior. Em especial por seu pai, interpretado por Robert DeNiro, que não atuava de forma tão convincente há muito tempo. Ele faz um torcedor fanático e supersticioso do time local de football e um apostador inveterado que vê em Pat um tipo de talismã. A superstição, nesse caso, revela uma frustração que o pai de Pat tem enquanto pai, e serve como um tipo de pretexto para recuperar o tempo perdido com o filho e restabelecer laços corroídos pelo tempo e pela falta de tato.

O melhor de O Lado Bom da Vida está no modo como o filme estabelece relações afetuosas corrompidas pelo tempo através de personagens cativantes. Enquanto reata laços partidos, constrói também a relação entre Pat e Tiffany, que cresce ao longo do filme por caminhos sinuosos.

A forma inspirada como o ator Bradley Cooper interpreta esse cara desajustado e bipolar é sempre carregada de um virtuoso carisma. No contraponto, a atuação de Jennifer Lawrence complementa esse carisma com sua ríspida delicadeza.

O equilíbrio entre romance, comédia e drama surge então de uma beleza ingênua que se sobressai no modo como os personagens se relacionam. Ora de forma bastante dura, ora com disfarçado afeto. Quase sem perceber, atuam um sobre o outro, cada um tentando livrar seu próprio peso sem notar de imediato que também toma para si o peso do outro. Esse balanço dá ao filme um tipo de leveza que não dissolve ou esconde o drama. Evita, assim, um arrastado peso na gravidade dos gestos, como por outro lado não se deixa cair no riso tolo da comédia banal.

O filme só enfraquece nos momentos em que abre mão da sutileza, apelando para o óbvio. É o que acontece, por exemplo, em uma troca de cartas, quando uma simples mudança no ângulo da câmera daria força ao mistério que acaba não sendo mistério algum. O mesmo acontece quando um gesto involuntário é filmado com tanta ênfase e obviedade que simplesmente apaga a sutileza, derrubando assim parte do significado, que estava justamente na sutileza de um gesto mal percebido.

Esses deslizes, que são sintoma de um exagero explicativo que contamina o cinema comercial, não chegam a comprometer a experiência do filme. São poucas interferências equivocadas, que não ofuscam o brilho da dupla de protagonistas. Pois o que o filme tem de melhor está além das ótimas atuações de Cooper e Lawrence, mas principalmente na incrivelmente magnética química que conseguem produzir na tela.
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Silver Linings Playbook
David O. Russel
EUA, 2012
122 min.

Trailer

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