segunda-feira, janeiro 10, 2011

Incontrolável



Unstoppable
Tony Scott
 EUA, 2010

O novo filme de Tony Scott funciona como tensão de uma real possibilidade. Além disso, parece resgatar o bom e velho filme-catástrofe, um subgênero hollywoodiano, que vai e volta de tempos em tempos. Isso porque o cinema, algumas vezes, reflete em suas produções temores do subconsciente coletivo de uma época. Filmes como “Inferno na Torre”, de 1974, e “O Dia Depois de Amanhã”, de 2004, são clássicos exemplos, cada um atendendo a “demandas” inconscientes de suas respectivas épocas.

Mas “Incontrolável” não se enquadra em uma suposta demanda, não tem essa pretensão e muito menos essa grandeza. O resgate a que me refiro como “bom e velho” é de um filme-catástrofe físico, terreno e plausível. Essa catástrofe independe de intempéries climáticas, invasões alienígenas, ou absurdos improváveis da natureza. Não por acaso é inspirado em um acontecimento real. Dessa forma, sendo uma possibilidade mundana, trabalha melhor nosso medo físico e menos nossos medos inconscientes.

Um trem com algumas dezenas de vagões de carga, alguns desses vagões com material tóxico, correndo a toda velocidade, sem ninguém no comando e passando por áreas povoadas. São esses os elementos que compõem a tensão constante de “Incontrolável”.

Na elaboração da iminência do desastre, Tony Scott trabalha com a sucessão de erros e personifica de forma inclemente a responsabilidade pelo desleixo. Deixa de lado qualquer pudor e constrói a cena com um tom patético, atribuindo a um funcionário relapso e obeso o crédito pelos sucessivos erros de procedimento. Pouco antes dos créditos finais, o filme dará o golpe final no funcionário, quando dirá em que ele trabalharia atualmente, após os desfechos dos eventos.

O que essa elaboração da crise, resultado de falha humana evitável, cria, é a sensação crescente do inevitável desastre. Nisso, o filme é bem trabalhado, seguindo a cartilha do “disaster movie”, mostrando passo a passo a sucessão de eventos que culminarão com a tragédia. É uma forma eficiente de envolver o público, de inserir a expectativa aflitiva das conseqüências devastadoras.

Também há o modo como o diretor e sua câmera compõem a imagem do trem. Pelos recursos aplicados, Scott transforma a composição em um ameaçador - e aparentemente imbatível - monstro sem controle. Nesse sentido, “Incontrolável” preserva o espírito do subgênero a que se propõe, mas nas mãos de Tony Scott, absorve também os cacoetes do diretor.

Conhecido por utilizar em seus filmes uma edição ágil, dialogando com a estética da publicidade e do vídeo-clipe, Tony Scott fez relativo sucesso com filmes como “Maré Vermelha”, “Inimigo do Estado” e “Jogo de Espiões”. Mas as virtudes dessa estética, capaz de ampliar e sustentar a tensão, mantendo a narrativa em constante frenesi, se tornam excessivas em “Incontrolável”. Esse excesso causa, depois de algum tempo, um cansaço visual, uma repetição que tem como conseqüência o enfraquecimento do efeito desejado.

Atenua esse enfraquecimento da tensão a presença do sempre ótimo Denzel Washington, que interpreta um experiente funcionário da ferrovia que tentará parar o trem. Denzel, mesmo quando não está no seu melhor, consegue emanar seu carisma, e sempre segura bem seus papeis. Mesmo seu parceiro na história, o Chris Pine, que faz o papel do novato em seu primeiro dia de trabalho, apesar de não alcançar o patamar de Washington, consegue não fazer feio.

Na soma de suas qualidades e defeitos, e dentro de uma expectativa de entretenimento, “Incontrolável” se mostra um bom programa. Ainda que incorra em falhas e repetições, consegue de todo modo manter o expectador tenso, temendo o grande desastre. A câmera de Scott potencializa o perigo ao dimensionar o trem como algo realmente selvagem, ameaçador, gigante, feroz. Esse é o grande mérito do filme, que se insere, justamente por isso, na boa e velha tradição do filme catástrofe, cujo sentido é dar ao cotidiano uma súbita dimensão de perigo e ameaça. Nesse sentido, o filme cumpre seu propósito e se no final incorre num certo esvaziamento, consegue mesmo assim ter sido uma boa experiência de tensão.
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