quarta-feira, janeiro 25, 2012

Precisamos Falar Sobre o Kevin



We Need Talk About Kevin
Lynne Ramsay
Reino Unido/EUA, 2011
112 min.

Em sua primeira metade, Precisamos Falar Sobre Kevin é uma obra desconcertante. O filme nos joga para dentro de um sentimento de desconforto, nos atinge com uma angústia poderosa, nascida de algo intangível. Impressiona o modo como sua atmosfera avoluma-se, como o invisível – um malefício que não vemos claramente – permeia as imagens desde os primeiros planos.

Do mistério por trás de cortinas esvoaçantes para uma festa popular na Espanha, uma guerra de tomates que reúne milhares de pessoas. É o salto que abre a narrativa. Em meio a uma multidão avermelhada, a figura de Tilda Swinton desliza em câmera lenta, ergue-se na multidão, regozija-se numa espécie de prazer, entre o transe e o orgasmo. Depois a depressão, a maternidade e a gênese do mal. Nem sempre nesta ordem.

É a fragmentação desnorteante do início de Precisamos Falar Sobre o Kevin, somada a uma interpretação extraordinária de Swinton, o que nos angustia plenamente. Ela interpreta Eva Khatchadourian, mãe de Kevin. Uma mulher que diante de uma tragédia provocada pelo filho de 16 anos se alterna entre a culpa e a investigação da memória em busca de respostas.

Na sua segunda metade, o filme se distende. A fragmentação diminui e temos uma maior linearidade nos acontecimentos. Mas isso não é capaz de dissolver os sentimentos provocados pelo seu início. É quando adentramos na intimidade de uma relação entre mãe e filho, do nascimento até o horror. Numa nova atmosfera de prenúncio do terror, assistimos à crescente agonia de uma mãe que não sabe se ama seu filho.

Em Kevin, desde a tenra idade, paira o avesso, uma esfera de absoluta maldade, raramente disfarçada. É entre o crescimento desta maldade – uma anomalia humana impenetrável – e a absorção dos acontecimentos fatídicos de um ápice de horror, de maldade indizível e fria, que oscila Eva. É dela que brotou o mal e seu nome bíblico não é um mero acaso. Na condição de mãe de Kevin, talvez seja sua maior vítima, talvez tenha sido desde sempre o principal alvo do filho monstruoso, nascido de suas entranhas.

Adaptado do romance homônimo de Lionel Shriver e dirigido pela britânica Lynne Ramsay (diretora do premiado Ratcatcher, de 1999), Precisamos Falar Sobre o Kevin é um ensaio sobre uma maldade inata e a esfera de relações desta natureza inescrutável. Eva, em sua jornada pelo inferno, busca explicações na sua condição de mãe, mas desconcerta-se por não encontrá-las. Seu inferno pessoal, as agressões de que é vítima, sua culpa impregnada fazem dela um poço de sentimentos fragmentados.

Com uma narrativa poderosa, a diretora Ramsay nos infiltra na investigação desses sentimentos. Sua direção, a atuação devastadora de Tilda Swinton, a montagem desnorteante da narrativa, tudo resulta em uma intensidade esmagadora. Precisamos Falar Sobre o Kevin é uma obra-prima, capaz de nos envolver intensamente de forma desconcertante e arrasadora.
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