terça-feira, dezembro 28, 2010

Leões e Cordeiros



Lions for Lambs
Robert Redford
EUA, 2007

“Leões e Cordeiros”, novo filme de Robert Redford (depois de sete anos sem filmar), é muito mais um exercício de retórica do que de cinema, mas ainda assim é uma bem construída peça de crítica e reflexão sobre a realidade política, noticiosa e juvenil da América pós Afeganistão/Iraque. E apenas isso já é massa crítica relevante suficiente para compensar a eventual digressão de linguagem, pendendo para retórica o que seria cinema.

A trama de “Leões e Cordeiros” se apresenta em três frentes distintas, aparentemente desconexas, mas que revelam, ao longo da projeção, estarem intimamente relacionadas.

Em Washington, uma jornalista experiente recebe de “presente” uma entrevista exclusiva com um senador republicano em franca ascendência política, onde ele lhe contará sobre uma nova estratégia ofensiva no Afeganistão que poderá, finalmente, pôr fim à guerra e iniciar a reconstrução do país.

Na Califórnia, um jovem e brilhante universitário, desiludido com a política, tem uma conversa intensa com seu professor de Ciência Política, onde este tentará dissuadi-lo de seu desinteresse.

No Afeganistão, dois soldados participam ativamente da nova operação arquitetada por Washington e se vêem, de repente, sob as conseqüências diretas das escolhas que fizeram em suas vidas.

O pilar do filme, mais do que tudo, são os diálogos. Pontos de vistas divergentes se enfrentam afiados, disparando mais que argumentos e contra-argumentos, disparando, sobretudo, farpas contundentes e atordoantes de ambos os lados.

E por “lados”, temos a jornalista opositora ao governo e o senador republicano entusiasta da guerra e da atual política norte-americana; temos o professor de ciência política e seu brilhante e articulado aluno, que iniciam um jogo de armadilhas que logo se transforma em um debate franco.

Já os dois soldados na frente de ação terão sua condição discursiva em flashbacks que os pontuarão na trama como elementos da realidade física, factual, para além do debate e da retórica. Pois os soldados não são discursos, teorias e argumentos; não são pontos de vistas, eles sofrem – e são - a conseqüência direta e real das teorias de gabinete e auditório. Eles são os que sangram, à frente dos que apenas falam.

Assim, entre blefes, dissimulações, atos destemperados e conseqüências trágicas, “Leões e Cordeiros” vai emaranhando uma trama de provocação e debate, mostrando lados distintos de questões pertinentes, entrelaçados entre si e com conseqüências para todos.

Pode-se dizer que o filme não lança luz a nenhuma questão abordada, ou que usa argumentos desgastados e nada originais nas questões sobre engajamento e política.

Mas não é sua intenção dar respostas, sua maior proposição é sacudir o pensamento acomodado do americano médio, desinteressado da realidade política, além de reacender o debate sobre a postura da imprensa norte-americana, questionando quando há notícia e quando há propaganda na divulgação de um fato. E, por fim, exibir a desiludida apatia de uma juventude sem grandes engajamentos ideológicos. 

Se os argumentos são velhos, é porque nada está mudando e a estupidez apenas se repetindo.

Ademais questões de cunho estritamente cinematográfico, o filme conta com uma edição eficiente, capaz de nos contar sua história e seus entrelaces de forma clara, sem apelar para grandes obviedades que ofendam a inteligência do público.

E se nomes como Maryl Streep, Robert Redford (que também atua no filme) e Tom Cruise (desse nunca espero muito) não trazem atuações à altura de seus nomes, tão pouco pecam no equilíbrio de seus personagens e não comprometem em nada o resultado final.

“Leões e Cordeiros” pode não ser um filme memorável ou fundamental, pode não ser genial ou revolucionário, mas conta com a exceção de ser inteligente e bem feito, de ter um roteiro bem montado e de ter a coragem de cutucar feridas velhas e recentes do orgulho americano. Mais do que isso: tem o grande mérito de, em tempos de apatia, ser intenso, franco e contundente.
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